quarta-feira, 8 de dezembro de 2010

o café da manhã do lagarto

o tempo se despega de mim
como se estivesse trocando
de pele

cada manhã custa renovados compromissos
acordo comigo mesmo
ruminando

cada vida que um dia
me aconteceu espero
algo

que ainda não tem contorno
(apenas pulso) continuo
a vigília mas deixei

de reparar deixei de me importar
com a chuva
com padrões de privacidade mas

relâmpagos alagam de luz
pontes vias expressas e logo as devolvem
ao breu

rasga a madrugada o raio-serpente
iluminam-se os sete bilhões de rostos
do Senhor do Mundo

a rede aviventa os mortos-vivos
banais consumidores de infernos
bairros ruas e condomínios fechados

sábado, 13 de novembro de 2010

ô disse eu

o fato é que estou cada vez mais desatento
cada vez mais bipolar
mais hipertenso
menos

conectado

a verdade é que não acredito
mais
na verdade
(desacreditei até do beijo francês)

não acredito mais em jornais
promessas de deuses
longínquos
ou vizinhos

só continuo vivo por esquecimento
acomodação
e uma praticidade mesquinha que me leva
a fazer sempre as mesmas
poesias

ao mesmo tempo em que acredito em tudo
(TUDO pode acontecer)
nada me apavora
mais

o fato é que não inventei a novidade
do milênio
permaneci quieto e resignado enquanto meu país
deixa
que homens e mulheres escrevam de uma maneira perfeitamente
controlada

as minhas palavras não funcionam
não são antenas da raça nem
antecipam
futuras gerações ou desenvolvimentos sociais
e técnicos

falta uma espécie de energia aquela
que sobra nesta época
desabrocham as gardênias
acres damas-da-noite
atenuadas pelas magnólias manjericos
e jasmins
________________________________________
foto: Célia Mello (www.fotografiacontemporanea.com.br

quarta-feira, 10 de novembro de 2010

Zoadinha e o Iluminado


Zoadinha. E dizer que ela descobriu o apelido que a homarada da vizinhança lhe pregara pelas costas só depois que foi trabalhar na casa do velho. A tia que pagava a faculdade do irmão falecera e os herdeiros em guerra cortaram logo o bolsa-escola da solteirona benemerente, de modos que resolveu pegar o turno da noite no home care do ricaço para completar as despesas. Casa de remediado, cai um copo, racha um prato.

― Zoadinha... mas gostosa. A coda do apelido os garanhões de subúrbio, evidentemente, não disseminaram... ― o velho era de falar tudo na bucha, ela, zero burra, devolvia jabs com cruzados, respondia ganchos com diretos. Entenderam-se desde o primeiro encontro.

Saía do trabalho às sete, chegava, dava um talento na casa, deixava a janta pronta e tomava uma ducha rápida antes de sair para a terceira jornada, das nove às seis. De dia era atendente na farmácia do bairro, a falsa magra do balcão; os marmanjos se revezavam em levar-lhe uma cesta provida de camisinhas, ky e comprimidos de levanta-pau só para vê-la no caixa, corando como pimentão enquanto fazia a soma, embalava e indicava os produtos na promoção.

― Faz um desconto do bom, porque ainda vou gastar no rolê com a mina. Mulher e carro, já viu, precisa de dinheiro e gasolina ― disse um.

― Esta casa parece uma caixa com paredes feitas de livros; muitos deles, você que escreveu. Pra quê? ― não era feia, o que é, é que, à primeira vista, o projeto geral parecia meio escangalhado; sobretudo as feições eram esparsas, distribuídas por um crânio alongado demais em que o osso extenso do nariz vinha até embaixo, alargando pouco ao aproximar-se dos lábios generosos. As pupilas, tinha-as fugidias e negras, aqueles olhos quirguizes de caboclo meio puxado a índio, o que os cabelos longos e escuros confirmavam, mas a pele desmentia com uma brancura sardenta e sujeita à ruborização constante.

― Qual deles você gosta mais Zoadinha?... Ah, muito perspicaz, é o meu preferido também; ganhei prêmios com ele ― acabara de completar noventa anos; era de estatura média, não fosse pelo cabeção desproporcional emoldurado por grossas sobrancelhas, nada haveria nele que fosse fisicamente incomum, nem mesmo a magreza que a idade acentuara. Viúvo, seis filhos e cinco netos; ficou morando sozinho no casarão ilhado pela deterioração do bairro. Por causa dos joelhos, não conseguia mais se levantar de cama ou cadeira sem ajuda; um pequeno exército de cuidadores orbitava em torno dele 24 horas por dia. Era considerado um gênio vivo.

O que nela também não colaborava era um começo de giba, conseqüência postural da timidez, que dava a impressão de encurtar o tronco, além de conferir um jeito de cambitinhos arqueados às pernas, além de empurrar para dentro uma bunda que mereceria o destaque da lordose. O velho catucava, chamava-a na chincha, por que acreditava ela ser dedo-podre no amor? ― Aos vinte e sete anos parece cedo, ok, comparada ao senhor sei que não é nada, mas já desisti. Sou que nem curva de rio, só pára tranqueira ― firmes e empinados peitinhos, somados à auto-ironia sarcástica derretiam o ancião.

― “Teomaquia, a luta contra o Deus do mundo e os deuses interiores”... É verdade que teve uma... visão? ― habitualmente iam até meia noite na prosa, raramente tinha trabalho de madrugada, embora às vezes ele se cagasse todo e aí era uma trabalheira dos diabos dar-lhe banho e trocar a roupa de cama. Fora que o coitado ficava pra lá de desconsolado no dia seguinte. O descompasso, cada vez mais acentuado, entre o corpo e a mente acabrunhava-o, sentia-se traído pelo arcabouço em desintegração enquanto o espírito permanecia cruelmente lúcido.

― Senti o Deus que há dentro e fora de nós, fui do visível ao invisível, pulei da realidade subatômica, em que a noção de distância deixa de fazer sentido, aos confins do espaço, onde começa o umbigo do universo que contém este universo, e assim ao infinito; Zoadinha, conheci o sustentáculo do cosmos, a ligação de todas as coisas, o entrelaçamento do humano e da natureza, atingi a mais perfeita beatitude e o mais fundo desespero, onde o místico ultrapassa as aparências e encontra a verdade última, a unidade original em que Deus coincide com a realidade.

― Então foi assim que conseguiu criar a sua maçonaria? Ouvi dizer que só tem granfo lá... Agora, por que é que seus filhos não deixam o senhor aparecer?...

― Ser velho é virar papel higiênico: ou se está enrolado, ou cheio de merda. Por isso meus filhos me afastaram do dia-a-dia do meu instituto, como sustentar a figura de um fundador mítico, apresentando um homem que não anda nem limpa mais o cu sozinho?

― Só não entendo como o criador de uma seita pode falar nos seus livros que é preciso combater o Deus que existe em nós... o senhor é ateu?

― Não sou, nunca fui, religioso e nem fundei cabala nenhuma, sem embargo, não vejo como poderíamos nos livrar Dele, ao menos não definitivamente. Veja, durante a minha epifania não tive apenas um lampejo do que é o universo, mas também enxerguei como as coisas realmente funcionam neste mundo. Daí que passei a vender o único artigo de fé do homem moderno: eficiência.

― Fugiu da minha pergunta, para variar, vamos mudar um pouco, vou lhe ler o que escreveu: “assim como nos chegou, o relato da Criação é uma história mal contada, e toda história mal contada acaba por revelar muito mais do que gostaria”.

― Claro, olhe, quando duas criaturas se encontram, é quase impossível que a mais forte não devore, abuse ou explore a mais fraca. Vale entre animais, vale entre os humanos e Deus; não digo que Ele exista lá fora, no espaço sideral, acontece que, a partir do momento que a linguagem entra em nós, a violência se consuma. A ordem simbólica só entra no corpo causando grandes estragos; Geová, o grande verme, o grande Outro que me habita e me descentra de mim mesmo.

― É arrepiante, o senhor diz que a Bíblia é a história de um estupro. Quer dizer então que nós dois aqui só nos respeitamos porque um não tem mais força que o outro?

― Pode apostar nisso. Leia o Bereshit com muita atenção, Javé cria animais selvagens e domésticos em pares de macho e fêmea e lhes manda frutificar e multiplicar; mas eis que faz exceção ao bicho criado à Sua imagem e semelhança quando leva seu rebanho para o Jardim do Éden, qual o motivo?, esquecimento, distração, lhe garanto que não foi...

― Só que vai uma grande distância afirmar que houve um abuso sexual no Paraíso!

― Um não, dois. Eva também entrou na dança. Atente para o fato de que o pecado original nada ter a ver com sexo, mas sim com o conhecimento; está lá, em Gênesis 3:21, “Eis que o homem se tornou como um e nós, conhecedor do bem e do mal.” Percebeu o “nós”? Deslize de tradução, interpolação tardia? Nada disso, Elohim sabe que não é o único tigre de papel no país das idéias platônicas. Ele cansara das vítimas, mas não do jogo; acompanhe a descendência de Adão e Eva, por que recusa Ele as oferendas do lavrador Caim, mas aceita as do pastor Abel?

― Eu li isso, é outro dos seus absurdos: Caim seria filho de Deus, Abel, de Adão... Já sei o que vai dizer, que Eva afirma ter possuído “um homem com a ajuda do Senhor”, antes de Caim nascer e que isto se repete com Maria e o Cristo, abandonado na cruz... loucura!...

― Chamo-lhe a atenção para a simbologia: árvore, escada e cruz; a árvore do centro do Éden, a escada do sonho de Jacó e a cruz onde morre o Cristo são arquétipos da ligação do mundo sublunar com o supra-sensível, mas também embutem o conflito primordial com a divindade, exemplarmente ilustrado pela luta de Jacó com o anjo.

― Sendo assim, o senhor está dizendo que Deus não é amor...

― Digo que não é só amor, porque há mais que isso em quem o conjurou. Zoadinha, pára de me chamar de senhor...

― Então, senhor, pare de me chamar de Zoadinha!

Alertada por um telefonema anônimo, Rosana, a filha que visitava o velho mais amiudadamente, descobriu que todo um tráfico se estabelecera no seio do improvável casal. Zoadinha vinha contrabandeando umas pilulinhas mágicas para espevitar o sábio geronte, peças íntimas dela foram encontradas nas gavetas do escritório onde se trancavam até altas horas. Demitiu-a sumariamente.

Uma equipe de médicos, incluindo geriatra, ortopedista, gastro e reumatologista, não chegaram a um acordo sobre o fenômeno: o velho passou a gemer dia e noite, a multiplicar queixas de dores por todo lado. Dava dó de ver.

sábado, 16 de outubro de 2010

preciso aprender a desistir (dos meus vícios)

devo confessar que já cometi
poemas


só que poesia é
fogo


poesia escapa sempre
escapa


fumaça de incêndio
(que não há)


na verdadeira poesia não há verdade
só poesia


a verdade é que na vida estamos sós
e a poesia


na vida a poesia é tudo
ou nada


e no entanto a vida pede uma poesia
que falta



mas à poesia não falta
nada

sábado, 9 de outubro de 2010

A Lenda da Maria Sangrenta


Naquela altura Anápolis mal chegaria aos trinta mil habitantes, mas tinha aeroporto, ou melhor, havia lá uma pista asfaltada onde pousava um bimotor por semana. O Presidente ia para a Amazônia com escala em Goiânia, o mau tempo forçou o pouso na cidade, onde, cem anos antes, Da. Ana das Dores perdera uma mula com a imagem de Santana. Da fazenda das Antas fez-se a cidade das Anas, como ficou cristãmente batizada.

A excitação foi geral, o Presidente fez comício, botou falação comprida e ali foi que assinou a declaração em que dizia ao povo que a capital seria transferida para a região central do país. Lindomar gostou logo daquele homem fino de rosto e de maneiras, que magnetizava a todos falando de um país grande e próspero que viria; o sobrenome do homem é que lhe não entrava na cabeça: ouvia “cu-de-chefe”, mas isso não era nome de gente.

O servente de pedreiro Lindomar não pensou duas vezes, assim que os empreitas começaram a recrutar, ele se mandou com mulher e três filhos para construir Brasília. Em novembro de 1956 ele estava lá quando começaram a esburacar as fundações do Brasília Palace Hotel e do Palácio da Alvorada. Nos próximos três anos e meio de insanidade épica, ele ajudaria a erguer aquelas caixas de vidro, mármore e concreto armado com seixos de quartzito.

Antes disso, porém, ele liderou uma revolta dos candangos no canteiro de obras do palácio; quebraram barracões da empreiteira e até derrubaram o “Catetinho”, galpão rústico de jacarandá e peroba do campo onde Juscelino se hospedava nas visitas à futura sede do Poder Executivo. A peãozada recusou-se a comer a carne bichada do rango. Os patrões responderam estralando o reio: mandaram dar uma coça nos líderes da rebelião, vitimando o amigo Paraibinha. Lindomar passou a freqüentar a casa da viúva.

Construir a cidade a partir do nada, no meio daquele cerrado seco e calorento, foi um desafio ao gênio da raça; o Brasil mostrava ao mundo um estilo próprio e único, amálgama do engenho e da arte de um povo voltado para a modernidade. As superquadras emolduradas por largas avenidas desembocando em rotatórias, a esplanada dos ministérios com a barragem do Paranoá ao fundo, a arquitetura de colossais vãos e curvas, os pilares de extrema leveza, os brises de fibro-concreto, os granitos, o elemento vazado dos combogós, tudo lhe dizia que virara um gigante. Vieram mais três filhos.

Como na vida ninguém passa sem aperreio, a viúva do Paraibinha, agora convertida em amante, emprenhou. Arrelia danada. O parto foi uma agonia, a criança, um macho, nasceu bem, mas a mãe quase morreu de uma hemorragia incontrolável. Uma vizinha amamentou o bebê enquanto a mãe se recuperava; Lindomar ia todos os dias visitá-los em Taguatinga. Até que Feliciana, a esposa traída, apareceu na porta do barraco, louca, virada no Coiso, ameaçando o marido, a amásia e a criança. Um pampeiro. Na saída, ainda chutou o cachorrinho cotó da outra.

Pressionado pela patroa, Lindomar mijou pra trás, negou-se a registrar a criança, ofereceu dinheiro e passagem para que a viúva deixasse o Distrito Federal. Ela recusou. Batizou o menino com o nome de Omar, homenagem ao pai fujão e lembrança perene de que, para ela e o filho, a vida nada tinha de linda. Mudou-se para o Rio de Janeiro, foi morar na Rocinha, no puxadinho do barraco de um irmão. Ele se tornou um pai exemplar para os filhos legítimos, conseguiu formar advogada a mais nova, Guiomar, que alcançaria altos cargos na Secretaria de Segurança, na Eletronorte e no ministério de Minas e Energia.

A ascensão da caçula tirou o pé de todos da lama, após trinta anos de sacrifícios a família deixou a cidade-satélite do Guará. Lindomar nunca mais soube notícias do filho, embora Omar freqüentasse a mídia carioca e nacional, traficante conhecido pela alcunha de Mazinho Biluca. Mazinho, implacável nos “negócios”, era um bom filho: instalou a mãe na cobertura de um prédio na favela, botou deque e piscina na varanda, ofurô, TV tela plana, piso de porcelanato e acabamento com pintura texturizada. Namorava Maria da Penha, a popozuda do pedaço. Vidão.

Biluca tinha o costume de pular a cerca, bandido quase nunca é homem de uma mulher só. Acontece que ele passou do ponto e catou a meia-irmã falsa loira da Maria, que, inconformada, resolveu se vingar do casalzinho. Maria era popozuda e linda, mas louca; entregou a fita para os traficantes rivais, molezinha, eles se encontravam fora da favela num apê de cinema que o safado comprara na Barra da Tijuca. Fez questão de acompanhar toda a operação: a tocaia, o julgamento dos chefões no alto do morro, o esculacho dos matadores e a execução de ambos com requintes de crueldade.

Os assassinos deixaram os pertences do Mazinho com Maria: um molho de chaves, o celular, um patuá e a automática. Desvairada, ela saiu a esmo, vagando horas a fio pelos dédalos da favela; chegando ao asfalto, foi tomada por uma firme resolução: queria conhecer o ninho de amor em que a traição se consumara. Pegou o lotação para a Barra. O apartamento era de um luxo delirante, os quadros rodavam à volta dela, as cortinas, os sofás, as luminárias; sufocou com todo aquele chiquê de uma vida estofada que não lhe tinha cabido. Deixou-se cair na cama redonda do quarto, chorava de soluçar.

O espelho, que tomava todo o teto do quarto, refletia cenas tórridas de sexo dos amantes mortos em alternância confusa com a imagem de uma mulher abandonada; como que acompanhava à distância seus próprios atos. Alguns dos livros mais antigos sobre a construção de Brasília trazem fotos invertidas, já que os primeiros registros foram feitos com filmes próprios para slide; da mesma forma, Maria enxergava aquela mulher lá no alto apanhar na bolsa uma arma, ficar de pé sobre a cama e colocar o cano na boca antes de estourar os miolos. A última coisa que viu foi o sangue salpicando o espelho.

O apartamento passou sete anos fechado. Nas noites de lua nova, corriam histórias de vizinhos sobre horríveis e inarticulados gritos vindos do quarto da Maria Sangrenta. Até que uma família se mudou para lá, um lobista de Brasília com a segunda mulher e o filho pequeno. A rádio-pião do condomínio logo noticiava que ele tinha sido pivô de um escândalo recente de intermediações fraudulentas na Controladoria Geral da União. Mudados às pressas, os novos condôminos se instalaram no novo lar sem reformas minuciosas, reservando o quarto do espelho manchado para acomodar o excedente do depósito. Proibiram o menino de freqüentar o cômodo.

Mas criança, já viu, proibiu, tentou. Lindomarzinho, xará do avô, buscava um boneco encaixotado do Ben Dez na ala proibida de seu novo castelo; os pais tinham ido buscar as compras de supermercado na garagem, era um sábado de folga da empregada. Deparou-se com o espelho que emanava uma luz baça, curioso, subiu numa pilha de caixas. Diz uma versão horripilante que o menino foi pego pela alma atormentada da Maria Sangrenta, que o escangotou até lhe quebrar o pescoço. O certo é que a partir daqui começa um mistério que o inquérito policial nunca conseguiu resolver: nas roupas da vítima foi encontrado o sangue de uma mulher.

Lindomar soube da notícia em Brasília, o antigo pedreiro não suportou o acúmulo deste golpe à dolorosa perda da indicação ao Ministério das Cidades pela filha Guiomar. Morreu de enfarte numa idade avançada que ele mesmo desconhecia; a última coisa que ouviu foi o neto de sete anos chamando por ele enquanto caía no abismo.

sábado, 2 de outubro de 2010

A Mansão dos Meninos Imaginários

― Secretário... sente-se por favor, fizemos uma edição dos vídeos da menina, hãm... são os trechos mais... polêmicos, os mais sensíveis, por assim dizer, para um dos carros-chefe do governador: a reformulação da Secretaria do Menor...

― Caralho Proença, o governador me comendo o rabo, essa bosta de vídeo bombando no twitter, a reeleição em primeiro turno perigando, como é que você acha que o homem tá, hem? Quem pôs banda larga nessa porra de abrigo?

― Foi uma doação dos rotarianos do bairro... as crianças é que criaram a conta, bem... já tiramos tudo do ar, o problema são os virais rolando nas redes sociais...

― Rede social de cu é rola, Proença!... Um puta estrago desses na reta final da campanha! Vamos ter que achar nessa merda daí uma saída, mandar para o marqueteiro da campanha aprovar... O governador tem coletiva de imprensa logo mais à noite, que cacete!

― Bem, vamos assistir neste aparelho... ah, não se preocupe, a sala passou por varredura...



“A Daiane dá saltos bem altos, eu sou a Daiane dançando, levanto a perna, requebro, dou pulos e cambotas, fazendo piruetas pelo ar e o mundo todo aplaudindo de olhos arregalados; ela é a menina mais bonita do mundo porque ela não é só uma campeã olímpica, porque ela é também Miss Universo, a mais linda de todo sempre; então, quando ela já ganhou a medalha de ouro mais o prêmio de um milhão de dólares, ela vai dar o maior de todos os saltos mortais de todos os tempos, a platéia fica com medo do que vai acontecer, ran-tan-tan-tan, são os tambores tocando no maior estádio do mundo, que nem no circo, e a Daiane voa muito alto, tão alto que ninguém sabe como ela vai descer, e então vem um menino muito bonito, igual aquele do “Esqueceram de Mim”, e pega ela voando e leva ela no trapézio para junto do pai e da mãe dele, que são também os donos do circo, e eu vou junto com eles viajando pelo mundo afora, deixando as pessoas muito admiradas na Europa e em Nova Iorque. Nós somos muito felizes e famosos em Hollywood também.”

“Agora, voltei a me chamar Rayane, que é meu nome de verdade; é que antes mudaram meu nome para Maria Eugênia, um nome feio e de gente velha, tenho 9 anos e estou no segundo ano do fundamental, não gostei que mudaram meu nome, também não achei bom quando me levaram, prefiro morar aqui: já conheço os monitores, a tia Neide da cozinha, as coordenadoras, o diretor; prefiro morar no abrigo, todos os meus amigos são daqui, do Abrigo Geneton Ilaci. A gente vem pra cá quando deixa de ser criancinha-bebê, daí ninguém mais quer adotar nós e falam pra gente que agora nossa família é o abrigo, só vamos sair quando ficar de maior; outra coisa que falam é que quem faz coisa que não deve vai parar na Fundação Casa, a FEBEM, lá é muito podreira, só tem meninos bem ruins que apanham muito dos monitores. A gente chama mesmo é de Fundação Casa do Capeta. Eu estou no Geneton porque meus pais morreram queimados no barraco onde a gente morava; o Elias, um menino mais velho, morava lá também na favela do Jaguaré e disse que os ricos quando vão fazer os condomínios deles mandam queimar as casas dos pobres. O Elias perdeu a mãe nesse incêndio, do pai ele nunca soube.”

“Tem uns tio bonzinho que sempre aparecem no Dia das Crianças e no Natal, eles dá presente pra nós; foram eles que botaram computador e agora tem Cartoon e Discovery Kids na nossa TV, mas os monitores só deixam a gente ver 2 horas por dia, eles são muito chatos, eles tá sempre dizendo: ‘tem coisa que pode e tem coisa que não pode’. Não pode é o que eles mais falam; criança não pode quase nada, mas eles fica assistindo filme a noite toda, que eu sei. O que eu mais gosto de ver no Cartoon é a Mansão Foster para Amigos Imaginários, a mansão é que nem o Geneton, o senhor Coelho e a Madame Foster recolhem os amigos imaginários quando as crianças abandonam eles ― nunca que eu vou abandonar a Daiane, ela é a minha melhor amiga. Lá na escola, as outra menina me zoa, elas não brinca comigo no recreio, nem convida para as festa delas; na escola tem os ‘populares’ e o resto, quem não é popular chamam de ‘os FEBEM’, mesmo que não seja do abrigo. Só não dizem na cara porque têm medo de apanhar, têm medo de nós, como se a gente fosse tudo bandido; as meninas da minha classe só me dão tchauzinho na saída, quando os pais buscam elas e eu estou entrando na perua do Geneton. Fazem só pra chatear, como dizendo: ‘agora eu vou pra minha casa, e você?’”

“Alguns meninos e meninas daqui tem mãe na prisão, todos sonham que ela vai voltar e tirar eles daqui; a mulher que me levou, Dona Mércia, disse que ia me levar para morar num apartamento grande, me chamava de filha, e que ia ter um quarto só pra mim e até ia ganhar um Gameboy; acreditei nela, todo mundo dizia que era uma chance na vida. Mas não foi nada do que ela falou, ela e só reclamava comigo: que não como direito, que não arrumo o quarto, até me levaram numa pissicóloga para ela tirar a Daiane de mim. Essa bruxa tava sempre gritando, me chamando de louca, dizia que eu não podia ficar falando sozinha, que fazia xixi na cama toda hora ― isso é vida? Daí que eu penso na história de ter uma chance, eu já tive uma chance na vida: ninguém sabe como não morri queimada junto com meus pais, se eu fosse a Daiane acho que eu tinha salvado eles; fico triste quando penso nisso, fico triste também porque aquela mulher mudou meu nome e botou o da mãe dela que tinha morrido. É ruim ser devolvida, parece que fui eu que aprontei e que não sirvo pra ninguém. Por isso que gosto tanto de ver a Daiane dos Santos na TV, ela é tão dez!, ela é uma campeã de verdade, admiro muito ela porque ela continua, dá aquele tuíste carpado mesmo sentindo dor.”

Os adultos só mandam, mandam em tudo, mandam nas coisa e nas palavra, por exemplo, quando a gente faz merda aqui no Geneton, primeiro os monitores dão bronca e depois vem o diretor e dá um castigo de verdade. Ser criança é difícil por causa dos adultos, ser criança demora muito; aprendi que primeiro a gente precisa saber quem manda nas coisas, para depois fingir que acredita no que dizem. Na escola nunca falam: ‘você está de castigo’, mas você está, fica fora da classe sem poder brincar, só esperando a aula acabar; você tá de castigo, mas eles dizem que não é bem assim. O problema de gente grande é que eles é só grande, não é melhor que nós, os pequeno, a gente vira grande quando esquece como é ser criança.”

quarta-feira, 29 de setembro de 2010

dezoito segundos

Quão
perto é o mais perto que você consegue chegar de um dinossauro? Do lado de um esqueleto de epóxi pintado numa exposição de arqueologia? Quanto a mim, lutei contra uma fera dessas com todas as minhas forças por dezoito segundos e, se não saí inteira, pelo menos estou aqui para contar a história.
Parece pouco,
dezoito segundos. Contados pelo meu marido que viu o começo da cena no alto de um barranco sem poder fazer nada. O importante é que me salvei, ele me salvou e os médicos também me salvaram.
Engraçado,
as duas primeiras coisas que me passaram pela cabeça, aparentemente, não tinham nada a ver com o que estava acontecendo; pensei na pesca do aruanã, um peixe carnívoro da amazônia, e no meu casamento.
Converti-me
ao judaísmo para poder casar com o Joel, em vão, já que descobri depois que não podia participar das principais festas do calendário religioso com os pais dele, freqüentadores da sinagoga dos Safra. O sobrenome Kogan, que não adotei, tem importância fundamental na tradição judaica: indica a descendência direta da tribo Cohen. Rabinos de verdade são da linhagem dos Cohen ou dos Levi.
Nunca
tive religião, queria apenas agradá-lo, conquistar a mãe dele e poder conviver com uma família grande e unida. Não tenho irmãos, perdi pai e mãe aos 20 anos, só restaram uns tios afastados e duas tias esquisitonas, Sônia e Vera, que cuidam da minha prima autista, Aline.
A outra
coisa que me veio à mente foi uma imagem terrível, a armadilha para o aruanã-prateado usando botos feridos. O aruanã sente o cheiro de sangue e vem de cardume para cima da gaiola onde está a isca viva, caindo nas redes da pesca predatória. Às vezes conseguimos tratar desses botos, abandonados feito lixo depois da
barbárie.
Vim para a Amazônia realizar a coleta de dados do meu pós-doutoramento; estudo o comportamento territorial e reprodutivo do pirarucu em Mamirauá, reserva ecológica no médio Solimões. O Joel desenvolve projetos de gestão pesqueira com populações ribeirinhas em áreas aquáticas protegidas; nos conhecemos na USP, ele terminando etnologia, e eu, caloura da biologia.
A noção
de desenvolvimento sustentável começou aqui em Mamirauá. Quase um milhão e meio de hectares de floresta tropical submersa, um mundo flutuante submetido a um regime de variação do nível de água da ordem de 20 metros. Um paraíso para cientistas, artistas, ativistas e... turistas.
Nada
contra o ecoturismo, o problema é que muitos pensam que estão no zoológico. Restos de comida humana, por exemplo, prejudicam a relação com animais in natura; uns imbecis aqui deram de alimentar um jacaré-açu de 5 metros e meio, só para filmá-lo alçando seus 500 kg para fora da água e abocanhando peixes no ar.
O vacilo
também foi meu, é verdade, mas a estupidez alheia contribuiu. Havia acabado de pesar e verificar as anilhas de um lote de pirarucus e despejava o tanque de coleta devolvendo-os para o rio. Um deles saltou de volta para o deque, peguei-o com jeito e me debrucei na beirada segurando firme pela guelra. E então,
o bote.
Uma bocarra com 80 dentes afiados saiu das águas escuras e fechou suas mandíbulas no meu braço esquerdo, me arrastando para o fundo. Como o som de taquaras secas, escutei os ossos do braço, do cotovelo e os ligamentos se quebrando instantaneamente. Ouvi um grito antes de cair
na água
― o Joel. Era como ter o braço esmigalhado por uma prensa mecânica, uma torquês operada por músculos descomunais; senti uma dor selvagem, desumana, uma dor que ninguém deveria conhecer; podia localizar cada ponto em que os dentes do bicho se enterravam na minha
carne
dilacerando o que encontravam pela frente. Os jacarés descendem de caçadores que estão aí há 230 milhões de anos, eficientíssimos, são predadores do topo da cadeia alimentar, tão eficientes, que caçam até outros predadores de topo como onças, pumas, jibóias e sucuris. Eu sabia exatamente o que ia acontecer
a seguir:
a dor tem esse efeito de nos tornar brutalmente conscientes. Tudo se passava rapidamente, embora fosse capaz de perceber a passagem de cada centésimo de segundo distintamente. Ele me levava mais e mais para baixo e para o meio do rio, remando propulsado pela cauda e as patas traseiras, enquanto à minha volta minguavam os fiapos de luz coados da superfície.
TRRLOOC!
Girando repentinamente sobre o seu eixo longitudinal, o gigante desencaixou completamente a articulação do ombro, supinando o meu braço num ângulo absurdo; a dor, que acreditava já estar no ápice, sofreu um acréscimo impossível, me conduzindo também a novos e insuspeitados patamares do medo pânico.
Perdi
os sentidos na volta do parafuso, o bicho voltou a atacar com violência, girando agora o membro que já não sentia, na direção oposta; desceu sobre mim uma calma escuridão pouco antes de registrar que o meu braço tinha sido arrancado de vez por um último puxão

acordei de uma noite cega em pleno campo de batalha, conhecia as regras: ele ia voltar, precisava engolir o naco que me arrancou para caber outro. Jacarés comem diariamente 10 % do peso na forma de presas vivas; eles não caçam propriamente, esperam imóveis, aguardam pacientes a vítima chegar desavisada, e só então se movem, rápidos, letais.
Algo
quis viver em mim; nadei louca para o cais, chorando alucinada, berrando, engolindo água, pedindo outra chance ― não queria morrer com 34 anos, não desse jeito. Realizei o sacrifício, entreguei uma parte à mãe d’água para ficar com o todo que sobrasse. Senti as mãos do Joel a me puxar pelos cabelos e camisa para cima do flutuante, do meu ombro jorrava uma coluna de sangue; nos beijávamos
abraçados
e ensangüentados, soluçando como crianças. Desmaiei de novo. Fui levada de barco e monomotor para a cidade de Tefé, onde fui operada de urgência; não posso exprimir em palavras a dívida de gratidão para com o Instituto, que me disponibilizou sua infra-estrutura incondicional e prontamente. Meu marido não saiu do meu lado.
Passei
um bom tempo me tratando, tranquei a pós, fiz análise, tomei 3 tipos de remédios para a depressão. Para minha surpresa, a sogra agora me tratava como da família, engolia sem questionar minha conversão fajuta na sinagoga reformista, onde homens e mulheres rezavam juntos, em português, e até rabina admitia. Joel me contou que desceu o barranco contando os segundos, procurando manter a vista no lugar onde eu desaparecera; ia encarar o jacaré-açu quando me viu subindo à tona.
A cabala
transmuta letras em números, e vice-versa, dezoito equivale ao valor numérico da palavra hebraica “Chai”, que significa “vivo”; no misticismo judaico, o número 18 corresponde ao poder da vontade na alma.
Finalmente
decidimos voltar para a floresta. Deixei a megacidade para trás como se fossem as fotos envelhecidas da infância de outra pessoa, hoje, no mapa do meu mundo, São Paulo é só memória, um pano de cimento sujo semeado de shopping centers. Selva bem mais perigosa que desejo
longe.

quarta-feira, 25 de agosto de 2010

a vida como ela era...

como já dizia o Nenê Berola, amigo das antigas
“o cão que morde, não lembra
o cão mordido, nunca esquece”

esta é uma lenda de priscas eras, do tempo em que as diligências
sacolejavam na poeira do Velho Oeste
os animais falavam
e os dinossauros ainda se arrastavam sobre a face da Terra

férias escolares, andava aí pelos dezessete, dezoito certamente
que não, pois ainda não votava, mas nessa época ninguém votava
só que essa é outra história; vai que fui pra Bahia
na boleia de caminhão

a namorada não quis, ou não pôde, ou havia um programa
na família; resultado: não foi comigo
escalei o amigo Tonho Brown, outro das antigas

bicho (como se dizia naquele então), eu tava amarradão
a brota era papo firme, cabeça feita; olhava, sentia e pensava
o mundo como eu

me explico: não quero dizer que ela pensava igual
a mim, mas que tinha sacadas próprias, originais, não tinha
aquela velha opinião formada sobre tudo

ah, Morro de São Paulo, casa de pescador, banho de latão,
praia de manhã, PF uma vez por dia e forró à noite até o dia
clarear ― mamão com açúcar

Tonho ficou injuriado comigo nos rasta-pés: mulherio
chegando junto e eu só saindo de lado, jogando na retranca
cobrindo a zaga, afinal, tava paradão na mina

“Escuta, se é pra você ficar aí de vacilão, vou te contar...”
e por aí ele foi: arrodeou, pigarreou, enrolou, mas desembuchou
que tal e cousa e lousa e maripousa ― tinha furunfado com a mina

a minha mina! e o pior é que não foi vez
foram vezes! daí só deu Maysa na vitrola do coração
meu mundo caiu, eu que aprenda a levantar...

saí da função cuspindo infâmias, que ele não era amigo
coisa nenhuma, um traíra, duas-caras, um pústula!
(essa eu tinha acabado de aprender num folheto)

a viagem tinha acabado, deixei o recinto pisando duro
degustando o fel da crocodilagem, ruminando o veneno da perfídia
rumo do barraco do pescador, Gonçalo, baiano sangue-bom

encontrei o Gonça num boteco e despejei-lhe minh’alma
ferida de Pierrô paspalhão;
arreganhando os belos dentes de imaculado branco

Gonçalo me conta a saga da sua recente desdita,
a burguesinha veio, se hospedou na sua humilde
cabana e dividiram cama, mesa e sonhos

jurou-lhe eterno amor, despediu-se em lágrimas, suplicou
que viesse para o Sul Maravilha, dormiria na edícula
da casa dos pais, até arranjar situação

“pois é, meu rei, não teve mole pra mim, não,
fui parar num cortiço em Sampa e, do sanduíche
de mortadela, só vi foi o dormido pão”

a gata já tinha se ligado em outro, burguesinho como ela
Damares fez dele gato-sapato, jogou ele abaixo de cão
“pe-pe-peraí Gonçalo, Damares?, mas, mas, então...”

você já adivinhou?, que ela era ela e o outro era eu?
Gonçalo se virou para o dono do estabelecimento
“Josafá, bote aí uma dose de amansa-corno p’a nós
mas capriche, que o caso é grave, visse?!”

Tonho se juntou a nós e daí não lembro mais nada,
só que terminamos a noite encachaçados até à alma
no único orelhão da ilha berrando para o pai dela:
“por favor, acorde ela, é caso de vida ou morte”

“você quer me explicar que palhaçada é essa?”
“Damares, não fica brava, nós só te ligamos
pra dizer que a gente te ama pra caraaaalhoooo!”

é o que eu sempre digo:
(embora essa seja do Serginho)
enquanto não der o sinal,
ainda é recreio

quarta-feira, 18 de agosto de 2010

Mastigar o bagaço cultural até sair o caldo

Estamos em São Paulo, a cidade suja da criatividade limpa.
A partir de agora usaremos todo o bagaço cultural para fazer nossa leitura.

Esse espaço vai trazer todo o bagaço cultural que existe neste planeta.
Vamos gastronomizar o que se produz em cada pedaço de
terra ou calçada, passando pela música, fotografia, cinema, teatro
e até o barrulho de chupar um pedaço de cana.
Vamos aproveitar até a última gota e o que sobrar é bagaço, é cultura.


O "Craque" no Brasil no ano da Copa.
Os nossos craques estão morrendo nas praças e espantando os pombos.
Se você quer conhecer esse jogo sujo,  é só passar por qualquer praça de qualquer capital do Brasil.
Os meninos estão jogando tudo nessa vida de "crak" e a sociedade está na arquibancada
não querendo ver esse gol contra e também nenhum a favor.



Dica no bagaço musical


Mafaro - André Abujanra
                                      
                                                            Experimentar e sentir o caldo
                                                            musical que estava perdendo.
  





                                                           Bagaça poética

                                                                     
          Quadro
                  (Maynart)

          Eu vi seus pés na tela
          Sombreando flores
          em luz amarela abajur
          Vielas de outra cidade
          Da porta à janelas
          Lugares e estação

                Eu li seu dia
                Eu li
                Eu li sua mão
         “Impressão, em sol levante”
         Picasso, Frida, F. Xavier, Di Calvacante
         Tarsila, Carybé, Cecília e Monet.


                          .